Monday, November 07, 2005
Vem aí uma grande exposição sobre Darwin no American Museum of Natural History aqui em New York. Abre dia 19 de novembro. É ao mesmo tempo uma apresentação didática da teoria da evolução e um mergulho na vida do cientista. Foram recriados ambientes onde ele trabalhou, como o navio Beagle, no qual passou pelo Brasil a caminho das ilhas Galápagos. Entre outras raridades, há o manuscrito no qual Darwin anotou o momento do Eureka!, quando ele intuiu a idéia da seleção natural. Imperdível.
Mas é triste ver que os americanos entraram em franca regressão intelectual e não acreditam na teoria de Darwin, como se ela fosse uma crença religiosa e não Ciência, a base de toda a biologia e de outros ramos científicos. Segundo pesquisa recente da rede CBS, 51% dos americanos acreditam que todas as espécies foram criadas por Deus, tal qual existem, e que a evolução não existe. E 38% gostariam que em vez da teoria da evolução as escolas ensinassem o creacionismo, a doutrina de que a Terra e a vida foram criadas por Deus exatamente como a Bíblia descreve, há 6 mil anos.
Está correndo na Pennsylvania um processo, em tribunal federal, de um grupo de pais contra um distrito escolar que obrigou os professores de ciências a incluir no currículo a advertência de que a teoria da evolução não está provada e que há outras explicações para a vida na Terra. Uma delas, o mais recente disfarce do criacionismo, é chamada de "intelligent design", mais sutil porque admite que a Terra e a vida existem há mais tempo do que a Bíblia afirma, mas insiste que as formas de vida são complexas demais para terem surgido espontaneamente, só podem ter sido criadas por uma inteligência superior.
A mesma direita cristã evangelica e fundamentalista que constitui a base política do partido republicano e do governo Bush pressiona para que a "teoria" do intelligent design seja ensinada nas escolas, e conta até com "especialistas", professores universitários e "cientistas" que refutam Darwin e a teoria da evolução. O presidente Bush chegou ao cúmulo de dizer que "os dois lados da questão" deveriam ter a mesma chance de ser ouvidos e ensinados.
O museu de história natural preparou seu pessoal para responder a críticas do público e teve a coragem de incluir na exposição sobre Darwin a afirmação de que a tal "teoria" do intelligent design não passa de um truque para reintroduzir o criacionismo, que a Suprema Corte proibiu que seja ensinado nas escolas públicas, em decisão de 1987 (mas que pode ser revista, nunca se sabe), por ser uma doutrina religiosa. Lembra também que os mesmos ataques foram feitos a Darwin quando publicou A Origem das Espécies há quase 150 anos. Os críticos da época se diziam indignados com a idéia de que o homem descenderia do macaco...
A campanha contra Darwin acontece ao mesmo tempo em que os Estados Unidos afundam na educação básica. Muitas universidades aqui são centros de excelência, mas recrutam cada vez mais estrangeiros, porque o ensino primário e secundário no país (mesmo que ainda ensine a teoria da evolução) caiu para níveis jurássicos. Em comparação com os outros países desenvolvidos, especialmente da Ásia, os estudantes americanos têm as piores performances em testes, seja em ciências, matemática, história, ou geografia.
Este país tornou-se a maior potência do planeta graças à engenhosidade e empenho de muitas gerações. Mas desde que se tornou o centro do Império, rico demais para seu próprio bem, o povo americano sentou-se sobre os louros, ligou a TV, abriu a cerveja e desligou o cérebro.
No mesmo museu que vai trazer Darwin de volta, há outra exposição pequena e instingante, Vozes do Sul das Nuvens. São fotos feitas por camponeses chineses de uma região montanhosa da província de Yunnan. Uma ong americana, a Nature Conservancy, distribui cameras simples e rolos de filme colorido entre os moradores das aldeias, e eles fotografam seu dia-a-dia e a natureza deslumbrante do lugar. São fotos de nível profissional. Mostram a dureza do cotidiano e a beleza da vida. E a criatividade do povo chinês. Com o declínio do império americano, a China vem aí! É a evolução natural... ou foi Deus quem assim quis?
Alguns dos camponeses-fotógrafos chineses foram trazidos a New York para a abertura da exposição. Não ficaram deslumbrados com a cidade. "Os prédios são muito altos", disse um deles ao New York Times, "mas nenhum é tão alto quanto nossa montanha mais baixa".
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