Saturday, January 21, 2006

DE QUE LADO VOCÊ ESTÁ?

Eu me exalto quando falo de Israel, e fico muito maniqueista, como bem apontaram Anna Maria, José Pires e outros, porque tenho paixão pela saga do povo judeu e vejo com muita tristeza como a questão de Israel está mais uma vez botando a maioria das pessoas no mundo contra os judeus. Concordo que o Sharon tem parte da culpa, mas as pessoas esquecem o que o outro lado fez e continua fazendo contra os judeus. Isso me deixa louco, essa cegueira em relação ao terrorismo contra Israel. O perigo de um novo Holocausto dos judeus, desta vez nuclear, é bem concreto. E os constantes ataques "suicidas" (na verdade homicidaS) de palestinos que se explodem nas cidades israelenses não deixam dúvidas sobre o objetivo dos terroristas árabes. Esses ataques só diminuíram depois que Israel ergueu a barreira de proteção chamada de "muro da vergonha" por aqueles que não acham uma vergonha o massacre de inocentes pelos terroristas.
Quero escrever agora sobre outro tema delicado, mas que não me deixa tão exaltado. É a presença americana no Iraque.
Bush fez tudo errado. Invadiu o Iraque sem ter esgotado a pressão coletiva pela ONU, perdeu a chance de fazer uma coalizão ampla contra Saddam Hussein, mentiu descaradamente para enganar a opinião pública americana.
Depois da queda de Saddam, foi pior ainda, perdeu-se a chance de estabilizar o país antes que a "insurreição" tivesse a chance de crescer.
Mas seria bom olhar o lado positivo também. O Iraque viveu por décadas sob uma ditadura sanguinária. Em particular, a ampla maioria, que segue o ramo xiita do islamismo, era massacrada e não tinha nenhum direito nem liberdade de praticar sua religião.
Isso acabou.
Duas eleições gerais já foram realizadas no país e um parlamento foi eleito. Os iraquianos se orgulham disso e mostram, depois de votar, o dedo manchado com a tinta que impede fraudes.
O parlamento reflete exatamente a proporção dos três principais grupos do país: xiitas, sunitas e curdos. Pela primeira vez na história do país, vai ser formado um governo representativo.
Há muitos problemas, a constituição feita pelos próprios iraquianos é cheia de erros, mas o processo democrático caminha. O Iraque está se tornando a primeira democracia do mundo árabe.
Há poucos dias, o New York Times citou um príncipe do Bahrain que disse: "Nós somos árbes tradicionais, a democracia não está na nossa natureza". Isso é ridículo, ou trágico. Os árabes são tão aptos a se autogovernarem quanto qualquer outro povo.
Quanto à "insurreição", acho que o nome está errado. Insurreição sugere rebelião popular, no caso contra um invasor, como aconteceu na Argélia contra os franceses e no Vietnam contra os americanos. Mas no Iraque não está havendo uma sublevação generalizada contra os americanos e seus aliados. Na maior parte do país os esforços destas forças estrangeiras para trabalhar na reconstrução do país tem sido bem-vindos.
O que há é uma coalizão de grupos armados que inclui militares do regime anterior, combatentes árabes que entram no Iraque pela Síria, e terroristas ligados a Al Qaeda. As táticas usadas por eles incluem confrontos diretos com as forças americanas em algumas cidades e áreas remotas do país, onde a maioria da população é sunita, emboscadas e detonação de bombas que têm por alvo militares americanos, e atentados contra a população civil xiita e curda, inclusive ataques sanguinários a mesquitas e serviços religiosos.
O objetivo é desmoralizar o novo governo iraquiano, acirrar o ódio entre as etnias e assim provocar uma guerra civil, e obrigar os americanos e aliados a se retirarem do país. O resultado seria algo como o Afeganistão antes da invasão de 2001, ou o que acontece hoje na região montanhosa entre o Paquistão e o Afeganistão, onde o Talibã e Osama bin Laden fazem a lei.
Indo às urnas em massa, os iraquianos repudiaram essa alternativa. Eles preferem avançar para uma democracia. Até os sunitas decidiram participar do processo político, se afastando dos grupos armados. E por isso políticos sunitas também passaram a ser alvo da "insurreição".
Aqui nos Estados Unidos a maioria deseja o fim da ocupação do Iraque. Mas ao mesmo tempo os americanos gostariam que todo o esforço e sacrifício já empregados no Iraque tenham algum resultado positivo. Por isso até a senadora Hillary Clinton, uma das possíveis candidatas a presidente pelo partido Democrata, é contra a retirada imediata das forças americanas. O candidato democrata derrotado em 2004, John Kerry, propunha até mandar mais tropas para o Iraque, para garantir a vitória contra a "insurreição".
Então, por mais que se critique o governo Bush por seus erros e crimes, seria aconselhável ver imparcialmente o que está acontecendo no Iraque.
E aí, parece que o melhor para o povo iraquiano seria a derrota da "insurreição" que tem feito muito mais vítimas civis do que qualquer "dano colateral" das operações dos americanos e aliados. É claro que muita gente deve achar que o Iraque estava melhor sob a ditadura de Saddam Hussein ou que ficaria ainda melhor num regime como o do Talibã, ou numa guerra civil. E aí faz sentido torcer pela "insurreição" e contra os americanos e o novo governo iraquiano. O que não dá é para ficar em cima do muro. Não existe uma "terceira via" no Iraque.

No comments: