PELO SIM... PELO NÃO...
COMPLEXO X COMPLICADO
SIMPLISMO X SIMPLES
Anna Maria Ribeiro
Estes são dois binômios fundamentais em qualquer planejamento. O intercâmbio de seus termos resulta num terceiro que expressa uma grande verdade: um problema complexo não pode ser encarado com simplismo sob pena de resultar numa grande complicação. É o que estamos observando neste nefasto referendo. Impossível discordar da quase totalidade dos argumentos dos sim e dos não. Todos têm razão e razão sólida. Os contra e os a favor. Quando isto acontece em resposta a uma pergunta é evidente que a pergunta está mal formulada. No mínimo porque aborda somente parte do problema, num simplismo pra lá de perigoso. Como discordar que a proibição de comprar armas legalmente fere os direitos do cidadão? Da mesma forma que estes direitos são feridos quando nem todos são iguais perante a lei; quando nem todos têm direito à educação; quando nem todos são respeitados. Como discordar que é muito perigoso ter uma arma em casa? Da mesma forma é impossível discordar que a quantidade de incidentes e acidentes provocados por tê-las é infinitamente menor que as mortes provocadas por mocinhos e bandidos que certamente não serão tocados pela proibição. Como discordar que é uma violência andar armado? Da mesma forma é impossível discordar que as pessoas estão com medo e que diante da inexistência de uma segurança pública, uma arma lhes dará a ilusória sensação de segurança que os ilusórios poderes públicos não garantem. Como ficamos nós diante de duas posições de uma mesma juíza, experimentada e preparada, que fornece em dois artigos argumentos antagônicos e irrefutáveis? Em resumo, como responder sim ou não? Proponho inverter as posições: nós cidadãos submeteríamos o Congresso e o Governo a alguns referendos, que os fizessem ter melhor comportamento: Vocês querem começar a trabalhar e a dar jeito neste País? SIM ou NÃO? Vocês querem estudar os problemas com a complexidade e a interrelações que existem entre eles? SIM ou NÃO? Vocês querem parar de jogar areia em nossos olhos, com referendos extemporâneos, voltando os de vocês para a origem dos problemas e não para suas conseqüências? SIM ou NÃO? Nunca anulei meu voto, mas não vejo como não fazê-lo agora. Em muitas eleições em que votei no “menos pior” gostaria que me tivesse sido dada a possibilidade de declarar meu voto explicitamente contra todos, assinalando uma opção que deveria existir: nenhum dos acima. O voto nulo é insuficiente e dúbio para expressar a discordância. A irritação e a paixão com que alguns se manifestam pelo Não e pelo Sim, têm a mesma origem, têm a mesma razão. Expressam convicções e sentimentos genuínos, verdadeiros, lícitos. Estamos todos revoltados, desesperançados, desanimados, tristes e que mais sei eu. Sempre achei que o Legislativo é muito mais importante que o Executivo. Se nele víssemos multiplicados os poucos deputados e senadores (independente de partido) que são orientados por valores éticos e com o conhecimento necessário para mudar as coisas, seria possível encontrar a cura para este nosso desânimo. Mas esta multiplicação só se dará se os colocarmos lá. É difícil, eu sei, neste País onde a informação é um luxo de poucos. Mas se com a mesma paixão com que se defende o SIM ou o NÃO, começarmos a divulgar o que sabemos, o que sentimos, quem sabe? Termino com uma frase do médico Miguel Pereira, atual depois de quase 100 anos, e que responde porque devemos nos revoltar, e como sugere o Fritz, providenciar para que “se vayan todos”:
“Por que? Porque a bondade que nunca se excetua não é bondade: - é passividade;
porque a paciência que nunca se esgota não é paciência: - é subserviência;
porque a serenidade que nunca se desmancha não é serenidade: - é indiferença;
porque a tolerância que nunca replica não é tolerância: - é imbecilidade”.
Prof. Miguel Pereira - No discurso da Colação de Grau aos novos Doutores em Medicina - 1916
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